Filosofia

  • A Arrogância da Oração
    Quando se chega ao limite do monólogo, aos confins da solidão, inventa-se — na falta de outro interlocutor — Deus, pretexto supremo de diálogo. Enquanto o nomeias, tua demência está bem disfarçada e... tudo te é permitido. O verdadeiro crente mal se distingue do louco; mas sua loucura é legal, admitida; acabaria em um asilo se suas aberrações estivessem livres de toda fé. Mas Deus ...
  • A ciência como conhecimento derivado dos fatos da experiência
    Na Introdução arrisquei sugerir que o lema “A ciência deriva dos fatos” capta uma concepção popular da característica distintiva da ciência. Nos primeiros quatro capítulos deste livro, esta perspectiva será sujeita a um escrutínio crítico. Descobriremos que muitas das implicações tipicamente atribuídas ao lema são indefensáveis. Ainda assim, descobriremos que o lema não é ...
  • A época das imagens de mundo
    Com a metafísica se consuma uma reflexão sobre a essência do ente e uma decisão sobre a essência da verdade. A metafísica funda uma época, na medida em que lhe concede o fundamento da sua configuração essencial através de uma interpretação específica do ente e de uma acepção específica da verdade. Este fundamento governa todas as manifestações que caracterizam uma época. ...
  • A fábrica de ideais
    — Alguém quer descer o olhar sobre o segredo de como se fabricam ideais na terra? Quem tem a coragem para isso?... Muito bem! Aqui se abre a vista a essa negra oficina. Espere ainda um instante, senhor Curioso e Temerário: seu olho deve primeiro se acostumar a essa luz falsa e cambiante... Certo! Basta! Fale agora! Que sucede ali embaixo? Diga o que vê, homem da curiosidade perigosa — ...
  • A Filosofia e a Visão Comum do Mundo
    Se me disponho a filosofar, é porque busco compreender as coisas e os fatos que me envolvem, a Realidade em que estou imerso. É porque quero saber o que posso saber e como devo ordenar minha visão do Mundo, como situar-me diante do Mundo físico e do Mundo humano e de tudo quanto se oferece à minha experiência. Como entender os discursos dos homens e meu próprio discurso. Como julgar os ...
  • A Filosofia entre a Religião e a Ciência
    Os conceitos da vida e do mundo que chamamos “filosóficos” são produto de dois fatores: um, constituído de fatores religiosos e éticos herdados; o outro, pela espécie de investigação que podemos denominar “científica”, empregando a palavra em seu sentido mais amplo. Os filósofos, individualmente, têm diferido amplamente quanto às proporções em que esses dois fatores entraram ...
  • A gama do vazio
    Vi este perseguir tal meta e aquele tal outra; vi os homens fascinados por objetos díspares, sob o encanto de projetos e de sonhos ao mesmo tempo vis e indefiníveis. Analisando cada caso isoladamente para descobrir as razões de tanto fervor desperdiçado, compreendi o sem-sentido de todo gesto e de todo esforço. Existe uma só vida que não esteja impregnada dos erros que fazem viver? Existe ...
  • A minha causa é a causa de nada
    Há tanta coisa a querer ser a minha causa! A começar pela boa causa, depois a causa de Deus, a causa da humanidade, da verdade, da liberdade, do humanitarismo, da justiça; para além disso, a causa do meu povo, do meu príncipe, da minha pátria, e finalmente até a causa do espírito e milhares de outras. A única coisa que não está prevista é que a minha causa seja a causa de mim mesmo! ...
  • A morte e a dor
    O Grande Desengano. O laço formado com inconstância pela criação é desfeito pela morte, sendo a penosa aniquilação o principal erro do nosso ser; o grande desengano. A Filosofia; Filha da Morte. Morte, gênio inspirador, a musa da filosofia. Sem a qual dificilmente se teria filosofado. A Noite Eterna. Quão longa é a noite da eternidade comparada com o curto sonho da vida. Não ...
  • A Natureza da Atividade Filosófica
    A atividade filosófica é sui generis. Parecemos viver muito bem sem ela. Aprendemos e ensinamos, trabalhamos, ouvimos música, vamos à praia e podemos construir nossas vidas com planos de sucesso e estabilidade financeira sem nos deixarmos envolver pelo discurso e pelos problemas filosóficos. Na verdade, os problemas filosóficos normalmente nos deixam incomodados, mal humorados, ansiosos. ...
  • A revolução darwiniana
    Não há futuro num mito sagrado. Por quê? Por nossa curiosidade. Seja o que for que consideremos precioso, não podemos protegê-lo da nossa curiosidade porque, sendo quem somos, uma das coisas que consideramos preciosa é a verdade. O nosso amor pela verdade é sem dúvida um elemento central no sentido que damos à nossa vida. Em qualquer caso, a ideia de que possamos preservar o sentido da ...
  • A subjetividade dos valores
    Não há valores objetivos. Essa é a crua enunciação da tese deste capítulo. Não obstante, antes de argumentar em sua defesa, tentarei esclarecê-la e restringi-la de maneiras que possam enfrentar certas objeções e evitar alguns mal-entendidos. A enunciação dessa tese está sujeita a provocar uma dentre três reações muito diferentes. Alguns pensarão que ela não é apenas falsa, mas ...
  • Aforismos para a Sabedoria de Vida
    Nestas páginas falo da sabedoria de vida no sentido imanente, como a arte de percorrer a vida do modo mais agradável e feliz possível; as instruções para isso também podem ser denominadas eudemonologia, pois ensinam como ter uma existência feliz. Tal existência talvez possa ser definida como uma que, vista de uma perspectiva puramente objetiva, ou após uma reflexão fria e madura — ...
  • Algumas palavras sobre o panteísmo
    A controvérsia contemporânea entre teísmo e panteísmo travada pelos professores de filosofia pode ser apresentada alegórica e dramaticamente mediante um diálogo ocorrido na plateia de um teatro em Milão, durante a representação. Um dos interlocutores, convencido de se encontrar no grande e famoso teatro de marionetes de Girolamo, admira a arte com que o diretor fez os marionetes e dirige ...
  • Alma
    É um termo vago, indeterminado, que expressa um princípio desconhecido, porém de efeitos conhecidos que sentimos em nós mesmos. A palavra alma corresponde à animu dos latinos, à palavra que usam todas as nações para expressar o que não compreendem mais que nós. No sentido próprio e literal do latim e das línguas que dele derivam, significa “o que anima”. Por isso se diz: A alma ...
  • Antropomorfismo como redução à ignorância
    Todos os prejuízos que me cumpre indicar dependem de um só, a saber: os homens supõem comumente que todas as coisas da Natureza agem, como eles mesmos, em consideração de um fim, e até chegam a ter por certo que o próprio Deus dirige todas as coisas para determinado fim, pois dizem que Deus fez todas as coisas em consideração do homem, e que criou o homem para que este lhe prestasse ...
  • Aparência e realidade
    Há algum conhecimento tão certo que nenhum homem razoável possa dele duvidar? Esta questão, que à primeira vista parece fácil, é na realidade uma das mais difíceis que se podem fazer. Quando tivermos compreendido as dificuldades com que se defronta uma resposta clara e segura, estaremos bem lançados no estudo da filosofia — uma vez que a filosofia é apenas a tentativa de responder a ...
  • Assim Falava Zaratustra
    Aos trinta anos apartou-se Zaratustra da sua pátria e do lago da sua pátria, e foi-se até a montanha. Durante dez anos gozou por lá do seu espírito e da sua soledade sem se cansar. Variaram, porém, os seus sentimentos, e uma manhã, erguendo-se com a aurora, pôs-se em frente do sol e falou-lhe deste modo: “Grande astro! Que seria da tua felicidade se te faltassem aqueles a q
  • Ateísmo, a última consequência do cristianismo
    A descrença é uma jogada num jogo cujas regras são estabelecidas pelos que creem. Negar a existência de Deus é aceitar as categorias do monoteísmo. Quando essas categorias caem em desuso, a descrença torna-se desinteressante e, em pouco tempo, sem sentido. Os ateus dizem que querem um mundo secular, mas um mundo definido pela ausência do deus cristão continua sendo um mundo cristão. O ...
  • Carta Prefácio a Fernando Savater
    Não é mim a quem corresponde, caro amigo, emitir um julgamento sobre um livro do qual sou objeto. Saiba, contudo, que sua tentativa de captar até o âmago de minha maneira ver as coisas iluminou-me sobre numerosos detalhes, sobre numerosas ilusões surgidas do êxtase ou da negação, e que, deste modo, fez-me um pouco mais exterior, um pouco mais estranho a mim mesmo, a qual deveria ser a ...
  • Carta sobre a felicidade
    (a Meneceu)Epicuro envia suas saudações a MeneceuQue ninguém hesite em se dedicar à filosofia enquanto jovem, nem se canse de fazê-lo depois de velho, porque ninguém jamais é demasiado jovem ou demasiado velho para alcançar a saúde do espírito. Quem afirma que a hora de dedicar-se à filosofia ainda não chegou, ou que ela já passou é como se dissesse que ainda não chegou ou que já ...
  • Ciência e senso comum
    Ninguém duvida seriamente de que muitas das ciências particulares existentes se desenvolveram a partir das necessidades práticas da vida quotidiana: a geometria a partir de problemas de medição dos campos, a mecânica a partir de problemas suscitados pelas artes arquitetônicas e militares, a biologia a partir de problemas da saúde humana e da criação de animais, a química a partir de ...
  • Como a ciência evolui?
    Sugiro que o objetivo da ciência é encontrar explicações satisfatórias para aquilo que consideramos precisar de uma explicação. Por explicação (ou explicação causal) entendo um conjunto de enunciados em que uns descrevem o estado de coisas a ser explicado (o explicandum) enquanto que os outros, os enunciados explicativos, formam a “explicação” no sentido estrito da palavra (o ...
  • Como é a filosofia analítica possível?
    Pouco antes do início do presente século, deu-se um episódio digno de nota em Viena. Em 1894, a Universidade encomendou a Gustav Klimt uma série de painéis que descrevessem o triunfo da luz sobre as trevas. O primeiro painel, concluído por Klimt em 1900, representava a Filosofia. Os Lentes esperavam, claro, qualquer coisa como a descrição rafaelina da escola de Atenas: Platão e ...
  • Como é ser um morcego?
    A consciência é o que torna o problema mente-corpo realmente intratável. Talvez seja por isso que as discussões atuais do problema dão a ela pouca atenção, ou a abordam de modo obviamente errado. A recente onda de euforia reducionista vem produzindo várias análises dos fenômenos e dos conceitos mentais, construídas para explicar a possibilidade de alguma variedade de materialismo, ...
  • Como se tornar um homem de gênio
    Se há entre os meus leitores jovens que aspiram tornar-se líderes do pensamento da sua geração, espero que evitem certos erros em que caí quando era novo por falta de bons conselhos. Quando desejava formar uma opinião sobre um certo assunto, costumava estudá-lo, avaliar os argumentos a favor dos diversos pontos de vista e tentar chegar a uma conclusão ponderada. Descobri depois que esta ...
  • Conferência sobre ética
    Antes de começar a falar sobre meu tema, permitam-me fazer algumas observações introdutórias. Tenho consciência de que terei grandes dificuldades para comunicar meu pensamentos e penso que algumas delas diminuiriam se as mencionasse de antemão. A primeira, que quase não necessito apontar, é que o inglês não é minha língua materna. Por esta razão, meu modo de expressão não possui ...
  • Da exclusividade
    Se buscamos uma relação de causalidade forte entre o que observamos e esperamos encontrar, sabemos que a religião não explica satisfatoriamente os fatos do mundo. Suas previsões são vagas e não raramente dependem de uma interpretação ad hoc para comprová-las. Maiores aprofundamentos sobre o assunto estão expostos nos vários livros a que temos disposição, e o seu número aumenta ...
  • Da incoerência de nossas ações
    Os que se dedicam à crítica das ações humanas jamais se sentem tão embaraçados como quando procuram agrupar e harmonizar sob uma mesma luz todos os atos dos homens, pois estes se contradizem comumente e a tal ponto que não parecem provir de um mesmo indivíduo. Mário, o Jovem, ora parece filho de Marte ora filho de Vênus. Dizem que o papa Bonifácio VII assumiu o papado como uma raposa, ...
  • Da moralidade
    Poderíamos ter moralidade sem um senso de empatia? Em outras palavras, teríamos comportamentos morais sem a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro? Se tirarmos da equação a vontade do agente moral, provavelmente sim. Afinal de contas, não é porque comportamentos tenham motivações individualistas que suas consequências não possam ter resultados bons para a comunidade, ou que não ...
  • Da simpatia
    Para supor quão egoísta possa ser o pior dos homens, há evidentemente alguns princípios na sua natureza, que lhe interessam relativamente à fortuna dos outros e que tornam a sua felicidade necessária para ele, embora ele nada daí retire a não ser o prazer de a ver. Deste tipo é a piedade ou compaixão, a emoção que sentimos por causa da miséria dos outros, quando ou a vemos ou a ...
  • De como filosofar é aprender a morrer
    Diz Cícero que filosofar não é outra coisa senão preparar-se para a morte. Isso, talvez, porque o estudo e a contemplação tiram a alma para fora de nós, separam-na do corpo, o que, em suma, se assemelha à morte e constitui como que um aprendizado em vista dela. Ou então é porque, de toda sabedoria e inteligência, resulta finalmente que aprendemos a não ter receio de morrer. Em ...
  • De empurrões
    Temos uma inegável sede por conhecimento e, por muitas vezes, superestimamos a nossa capacidade individual de adquiri-lo. Afinal, somos seres dotados de consciência e de raciocínio, capazes de resolver problemas quotidianos com relativa facilidade. Sequer teremos maiores problemas em errarmos, visto que muito de nosso aprendizado é adquirido por vias de tentativa e erro. Não é à toa, ...
  • Discurso do método
    Inexiste no mundo coisa mais bem distribuída que o bom senso, visto que cada indivíduo acredita ser tão bem provido dele que mesmo os mais difíceis de satisfazer em qualquer outro aspecto não costumam desejar possuí-lo mais do que já possuem. E é improvável que todos se enganem a esse respeito; mas isso é antes uma prova de que o poder de julgar de forma correta e discernir entre o ...
  • Do dogma
    Pela terrível conotação que o termo adquiriu, dogma nos remete imediatamente a algo negativo. Sem a menor das dúvidas, apontamos alguém irredutível, indisposto a mudar de opinião como dogmático. O termo vem do grego δόγμα , que, por sua vez, deriva do verbo δοκέω, equivalente a crer ou pensar, mas a palavra representa, literalmente, o que parece bom. O adjetivo dogmático, no ...
  • Dos valores
    Olhando para uma fotografia, podemos reconhecer todos os traços peculiares que definem as nossas características físicas em um determinado recorte histórico de nossas vidas. Apontamos para ela e usamos o pronome “eu”, e, de certa forma, aquela representação somos nós, mas não exatamente nós. São referências para nós, mas não se confundem conosco. Assim, não importa o quão boa ...
  • Dúvidas filosóficas
    Talvez fosse de se esperar que eu começasse pela definição de “filosofia”, mas, certo ou errado, não me proponho a tal. A definição de “filosofia” variará segundo a filosofia que adotarmos; para começar, diremos apenas que há certos problemas, julgados interessantes por certas pessoas, mas que não pertencem, pelo menos até agora, a qualquer uma das ciências especiais. Esses ...
  • Esboço de uma história da doutrina do ideal e do real
    Descartes é corretamente considerado o pai da filosofia moderna, principalmente porque auxiliou a faculdade da razão a ficar sobre seus próprios pés ensinando aos homens como usar seus cérebros onde até então se recorria à Bíblia ou Aristóteles. Mas é o pai em um senti
  • Fé na Verdade
    A matemática é a única religião que pode demonstrar que é uma religião. Paul Barrow É a matemática realmente uma religião? E a ciência? Hoje em dia ouve-se muitas vezes dizer que a ciência é “apenas” mais uma religião. Há algumas semelhanças interessantes. A ciência oficial, tal como a religião oficial, tem as suas burocracias e hi
  • Filosofia e ciências da natureza: alguns elementos históricos
    Este texto pretende oferecer ao aluno uma panorâmica geral e introdutória do modo como os filósofos têm encarado as ciências da natureza ao longo da história, e apresentar simultaneamente alguns elementos básicos da própria história do desenvolvimento científico. Nestas páginas encontram-se alguns elementos da história da ciência, mas, sobretudo, da história da filosofia da ...
  • Fisicismo
    Universidade de Notre Dame e Universidade de Brown O fisicismo é a doutrina de que tudo o que existe no mundo espaço-temporal é uma coisa física, e que toda a propriedade de uma coisa física ou é uma propriedade física ou uma propriedade que está de algum modo intimamente relacionada com a sua natureza física. Formulada assim, a doutrina é uma afirmação ontológica, embora tenha ...
  • Genealogia do fanatismo
    Em si mesma toda ideia é neutra ou deveria sê-lo, mas o homem a anima, projeta nela suas paixões e suas demências; impura, transformada em crença, se insere no tempo, adota a forma de acontecimento: o passo da lógica para a epilepsia está consumado... Assim nascem as ideologias, as doutrinas e as farsas sangrentas. Idólatras por instinto tornam incondicionados os objetos de nossos sonhos ...
  • Identidade pessoal
    Ao ser julgado por homicídio, o leitor decide defender-se a si próprio. Afirma não ser o assassino; o assassino e o leitor são pessoas diferentes. O juiz pede-lhe que apresente provas. Tem fotografias de um intruso com bigode? Não é verdade que as suas impressões digitais correspondem às que foram encontradas na arma do crime? Pode provar que o assassino é canhoto? “Não”, responde o ...
  • Investigação Acerca do Entendimento Humano
    A filosofia moral, ou ciência da natureza humana , pode ser tratada de duas maneiras diferentes; cada uma delas tem seu mérito peculiar e pode contribuir para o entretenimento, instrução e reforma da humanidade. A primeira considera o homem como nascido principalmente para a ação; como influenciado em suasavaliações pelo gosto e pelo sentimento; perseguindo um objeto e evitandooutro, ...
  • Memórias imaginárias de Lucrécio
    Tudo está calmo esta manhã no campo romano, uma calma que faz pensar no vazio além do qual se encontram os deuses. Para mim chega o momento de apreciar o conjunto de minha obra. Escrevo aqui um exame rápido, mas sem dúvida queimarei este documento. Só o poema deve permanecer. Está aqui, sob meus olhos. Depois de oito dias, continuo a repetir as primeiras e as últimas sílabas. As ...
  • Milagres, a Historia e a Ciência: uma análise do argumento de Hume
    Geralmente se pensa que o problema de milagres seja de interesse puramente teológico e religioso. Isso tem levado vários intérpretes de Hume a considerar sua discussão de milagres como algo que só tem significado no contexto da crítica humeana à teologia e à religião. Que a questão de milagres tenha alto interesse epistemológico no campo da teologia parece indiscutível. Grandes ...
  • Moral como Antinatureza
    Todas paixões têm uma fase em que são meramente desastrosas, em que aviltam sua vítima com o peso da estupidez — e uma fase posterior, muito posterior, em que se casam com o espírito, se “espiritualizam”. Antigamente, em vista da estupidez na paixão, declarava-se guerra à própria paixão, conspirava-se pela sua destruição; todos os velhos monstros da moral concordavam quanto a ...
  • Necessidade de uma Reforma da Filosofia
    Se algo desperta a nossa atenção, ao percorrermos os textos de L. Feuerbach, é a presença incessante da teologia. Conhece-a em primeira mão, está dela imbuído, com ela obcecado. Ele próprio afirmou: “Todos os meus escritos têm, em rigor, apenas um obje­tivo, uma vontade, um tema. Este tema é justamente a religião e a teologia e o que com elas se relaciona.” E a partir daí ...
  • Nihilism
    Nihilism can be defined as the implosion of subjectivity. Alternatively, and being a bit clearer, we can define it as a disbelief in any metaphysical foundation for human existence. It is not, however, something difficult to define, but to apprehend. Because it is a rather broad and abstract notion, there is much confusion around it. Let’s look at some of the main reasons for this. First, ...
  • Niilismo
    O niilismo pode ser definido como a implosão da subjetividade. Alternativamente, e sendo um pouco mais claros, podemos defini-lo como uma descrença em qualquer fundamentação metafísica para a existência humana. Não se trata, entretanto, de algo difícil de ser definido, mas de ser apreendido. Por ser uma noção bastante ampla e abstrata, existe muita confusão em torno dela. Vejamos ...
  • O Anticristo: ensaio de uma crítica do cristianismo
    — Com isto concluo e pronuncio meu julgamento: eu condeno o cristianismo; lanço contra a Igreja cristã a mais terrível acusação que um acusador já teve em sua boca. Para mim ela é a maior corrupção imaginável; busca perpetrar a última, a pior espécie de corrupção. A Igreja cristã não deixou nada intocado pela sua depravação; transformou todo valor em indignidade, toda verdade ...
  • O Antiprofeta
    Em todo homem dorme um profeta, e quando ele acorda há um pouco mais de mal no mundo... A loucura de pregar está tão enraizada em nós que emerge de profundidades desconhecidas ao instinto de conservação. Cada um espera seu momento para propor algo: não importa o quê. Tem uma voz: isto basta. Pagamos caro não ser surdos nem mudos... Dos esfarrapados aos esnobes, todos gastam sua ...
  • O Futuro de uma Ilusão
    O desamparo do homem, porém, permanece e, junto com ele, seu anseio pelo pai e pelos deuses. Estes mantêm sua tríplice missão: exorcizar os terrores da natureza, reconciliar os homens com a crueldade do Destino, particularmente a que é demonstrada na morte, e compensá-los pelos sofrimentos e privações que uma vida civilizada em comum lhes impôs.
  • O mito da caverna
    Sócrates. Figura-te agora o estado da natureza humana, em relação à ciência e à ignorância, sob a forma alegórica que passo a fazer. Imagina os homens encerrados em morada subterrânea e cavernosa que dá entrada livre à luz em toda extensão. Aí, desde a infância, têm os homens o pescoço e as pernas presos de modo que permanecem imóveis e só veem os objetos que lhes estão diante. ...
  • O Mito de Sísifo: ensaio sobre o absurdo
    As páginas que se seguem tratam de uma sensibilidade absurda que se pode encontrar esparsa em nosso século — e não de uma filosofia absurda que o nosso tempo, para sermos claros, não conheceu. É, portanto, de uma honestidade primordial assinalar, logo de início, o que elas devem a certos espíritos contemporâneos. Minha intenção de ocultá-los é tão pequena, que eles se verão todos ...
  • O Mundo como Vontade e Representação (livro 3)
    Apresentado no primeiro livro como pura representação, objeto para um sujeito, consideramos o mundo no segundo livro por sua outra face e verificamos como esta é vontade, que unicamente se mostrou como o que aquele mundo é além da representação; em conformidade, denominávamos o mundo como representação, no todo ou em suas partes, a objetividade da vontade, quer dizer: a vontade tornada ...
  • O Mundo como Vontade e Representação (livro 4)
    Esta parte do nosso estudo apresenta-se como a mais grave, em virtude de ser atinente às ações humanas, o que é um argumento que nos toca diretamente e ao qual ninguém pode permanecer estranho ou indiferente; muito ao contrário, é tão natural no homem o fato de tudo referir à conduta humana que, em seguindo o que quer que seja, é sempre a parte referente a essa conduta que ele considera ...
  • O niilismo europeu
    O niilismo está diante da nossa porta: de onde vem este que é o mais inquietante de todos os hóspedes? 1. Ponto de partida: é um erro ver nos “estados sociais de aflição”, ou nas “degenerações fisiológicas”, ou mesmo numa corrupção qualquer a causa do niilismo. Todas essas coisas admitem sempre interpretações total­mente diferentes. Ao contrário, é numa interpretação ...
  • O problema da indução
    “Se todos os cães são mamíferos e todos os mamíferos são seres vivos, então todos os cães são criaturas vivas”. Isto é um argumento dedutivo: podemos deduzir logicamente a conclusão das premissas. Se as premissas são verdadeiras, a conclusão (logicamente) tem de ser verdadeira. Se todos os que estavam a bordo do navio morreram afogados e a Marisa estava a bordo do navio, então a ...
  • O Valor da Filosofia
    Tendo agora chegado ao término de nossa breve e incompletíssima revisão dos problemas da filosofia, será conveniente considerar, para concluir, qual é o valor da filosofia e por que ela deve ser estudada. É da maior importância considerar esta questão, em vista do fato de que muitos homens, sob a influência da ciência e dos negócios práticos, propendem a duvidar se a filosofia é algo ...
  • O Valor da Ignorância
    “Só sei que nada sei”. Esta talvez seja a mais famosa sentença da História da Filosofia. Quem já não a ouviu? E quantos já não a pronunciaram em alguma ocasião? A sentença é originalmente atribuída a Sócrates, o filósofo seminal da Filosofia clássica grega. Sócrates não registrou em texto seus ensinamentos, mas o mais famoso de seus discípulos, Platão, nos legou uma extensa ...
  • O Vazio da Existência
    Esse vazio encontra sua expressão em toda forma de existência, na infinitude do Tempo e Espaço em oposição à finitude do indivíduo em ambos; no fugaz presente como a única forma de existência real; na dependência e relatividade de todas coisas; em constantemente se Tornar sem Ser; em continuamente desejar sem ser satisfeito; na longa batalha que constitui a história da vida, onde todo ...
  • Objetividade
    Uma componente importante da Metafísica Ocidental Comum é a tese de que há verdades objetivas. Esta tese tem duas componentes. Primeiro, as nossas crenças e asserções ou são verdadeiras ou são falsas; cada uma das nossas crenças e asserções representa o Mundo como algo que é de certa maneira, e a crença ou asserção é verdadeira se o Mundo é dessa maneira, e falsa se o Mundo não ...
  • Os Limites da Explicação Científica
    Alguns anos atrás, passei uma tarde com outros professores da Universidade do Texas (EUA) contando o trabalho de nossas respectivas disciplinas a um grupo de graduandos. Descrevi em linhas gerais o grande progresso que nós, físicos, havíamos feito no tocante à explicação do que era conhecido experimentalmente sobre partículas elementares e campos; como, enquanto estudante, eu tivera de ...
  • Paradoxos da Irracionalidade
    A ideia de uma ação, crença, intenção, inferência ou emoção irracional é paradoxal. Isso porque o irracional não é apenas o não-racional, que se encontra fora do âmbito do racional; a irracionalidade é uma falha dentro da casa da razão. Quando Hobbes diz que somente o homem tem o “privilégio do absurdo”, ele está querendo dizer que somente a criatura racional pode ser ...
  • Princípios da Filosofia do Futuro
    O núcleo essencial deste escrito de L. Feuerbach transparece, de forma sintética e acutilante, no princípio 51, sob a proposta de um novo imperativo categórico: “Sê apenas um homem que pensa; não penses como pensador, isto é, numa faculdade arrancada à totalidade do ser humano real e para si isolada; pensa como ser vivo e real, exposto às vagas vivificantes e refrescantes do oceano do ...
  • Racionalidade e realismo: o que está em jogo?
    Há décadas que assistimos, nas universidades americanas que se dedicam à investigação, a debates sobre a natureza do ensino superior. Controvérsias arrebatadas sobre o plano de estudos, sobre as exigências acadêmicas e mesmo sobre os objetivos do próprio ensino superior não são coisas novas. Mas os debates agora em curso são em certos aspectos invulgares. Ao contrário dos ...
  • Será o relativismo importante?
    Diz-se que o 11 de Setembro mudou o mundo. É possível que isso seja verdade, quanto mais não seja porque mudou o modo como muitas pessoas veem o mundo — e uma mudança nas ideias das pessoas é uma mudança no mundo. Não devemos esperar, porém, que muitas dessas mudanças sejam para melhor, visto que a regra geral é que, quando as pessoas estão zangadas e com medo, as suas ideias e os ...
  • Sobre a brevidade da vida
    (Observação: os números seguidos de traço e dois pontos correspondem a um capítulo, e os números entre parênteses, a versículos) 1 — 1: A maior parte dos mortais, Paulino, queixa-se da malevolência da Natureza, porque estamos destinados a um momento da eternidade, e, segundo eles, o espaço de tempo que nos foi dado corre tão veloz e rápido, de forma que, à exceção de muito ...
  • Sobre a filosofia universitária
    Os fins estatais da filosofia universitária foram, porém, os que propiciaram à Hegelharia um favor ministerial tão impar. Pois, para ela, o Estado era o “organismo ético absolutamente perfeito”, e ela fazia com que todo o fim da existência humana se absorvesse no Estado. Poderia haver uma melhor orientação para os futuros referendários e, em breve, funcionários do Estado do que ...
  • Sobre educação
    § 372 Devido à natureza de nosso intelecto, ideias gerais devem surgir por meio da abstração a partir de observações particulares; estas devem, portanto, existir antes das primeiras. Se isso de fato ocorre, como no caso do homem cujo aprendizado baseia-se exclusivamente em sua própria experiência — que não possui professor nem livros —, o indivíduo sabe muito bem quais de suas ...
  • Sobre livros e leitura
    Quando lemos, outra pessoa pensa por nós: só repetimos seu processo mental. Trata-se de um caso semelhante ao do aluno que, ao aprender a escrever, traça com a pena as linhas que o professor fez com o lápis. Portanto, o trabalho de pensar nos é, em grande parte, negado quando lemos. Daí o alívio que sentimos quando passamos da ocupação com nossos próprios pensamentos à leitura. Durante ...
  • Teeteto
    Euclides — Voltaste há pouco do campo, Terpsião, ou já faz tempo? Terpsião — Faz bastante tempo; procurei-te na praça do mercado e estranhei não encontrar-te. Euclides — É que não me achava na cidade. Terpsião — Por onde andavas? Euclides — Havia baixado ao porto, quando en­contrei Teeteto, que transportavam do acampamento de Corinto para Atenas. Terpsião — Morto ou vivo? ...
  • Teses Provisórias para a Reforma da Filosofia
    O significado de L. Feuerbach não se esgota com o fato de ter sido em parte, durante algum tempo, figura tutelar de K. Marx, nem a pertinência das suas ideias ficou definitivamente enfraquecida ou abalada com a crítica marxiana nas famosas Teses sobre Feuerbach. Pelo contrário, Marx e, mais tarde, Nietzsche nunca deixaram de lhe ser devedores na crítica que instituíram ao mundo moderno. ...