Homo sapiens revisitado

T. H. Abrahão

Introdução

projeto homo sapiens revisitado
projeto homo sapiens revisitado

O presente estudo é resultado do esforço dos mais proeminentes pensadores do mundo atual e da junção dos esforços de inúmeras universidades — tais como BTU (Boring Town University), USJBR (University of Saint Joseph of Black River) — e instituições de pesquisa, a saber, CIDCTA (Conselho Internacional de Desenvolvimento Científico, Tecnológico e Absurdo.), FATE (Fundação para o Amparo do Tédio) e CEAAPI (Centro de Estudos Altamente Avançados para o Progresso da Ironia).

O ‘Projeto Homo sapiens Revisitado’ é uma tentativa — em vão — de alavancar o avanço do conhecimento humano em relação a sua origem, evolução e futura bancarrota. O mundo é coisa antiga (que o digam os geólogos), e, por isso, diversos entraves favorecem o desfavorecimento de evidências sensatas.

Todavia, intenso, doloroso e saudosista, o presente estudo conseguiu reunir informações úteis para possíveis hipóteses sobre a posição do homem no planeta e o real significado de seus atos.

Não se trata, pois, de pessimismo; e sim de uma constatação da realidade. Ante a tortura das tendências e dos impulsos, os realizadores do ‘Projeto Homo sapiens Revisitado’ admitem que as semelhanças em relação aos fatos em estudo e as torpezas em se tratando das conclusões extraídas não são, em hipótese alguma, mera coincidência.

Se o mundo e o homem fossem exatamente como a sensatez aponta — sem traições lógicas ou absurdos metafísicos — considerariam o bom senso egoísta ou culpado? O estudo a seguir comprova que ambos os adjetivos são possíveis.

Homo sapiens: classificação científica

Reich: Animalia

subreich: Metazoa
filo: Chordata
subfilo: Vertebrata
classe: Mammalia
(des)ordem: Primates
família: Hominidae
(de)gener(açã)o: Homo
espécie: H. sapiens
nome binomial: Homo sapiens
nome real: Homo demens

<em>Fig.1</em>: Árvore filogenética. Diversos estudos apontam ancestrais comuns entre o animal humano e outros animais.
Fig.1: Árvore filogenética. Diversos estudos apontam ancestrais comuns entre o animal humano e outros animais.

O ser humano tem muitas definições, sejam elas biológicas, sociais, políticas, filosóficas et caetera. À luz da biologia, o homem é classificado como Homo sapiens (sic), ou seja, “homem racional” (sic), “homem sábio” (sic). É um primata bípede a fazer parte da superfamília Hominoidea, juntamente com outros símios não menos importantes, a saber, chimpanzés, gibões, gorilas e orangotangos (além de outras espécies atualmente extintas — ou ainda não catalogadas em virtude do receio humano pela concorrência).

Hominoidea é uma superfamília de primatas que divide-se em duas famílias, oito gêneros, vinte e uma espécies e mais de seis bilhões de bestas. Os Hominoidea apresentam maior diversificação em relação aos seus parentes mais próximos, os macacos Cercopithecoidea. Observa-se uma grande variação no tamanho corporal (dos gibões asiáticos aos imensos halterofilistas humanos) e na cobertura do corpo (da densa cobertura de pelos dos gibões aos trajes de gala do homo demens (doravante “homo sapiens”, para efeito de sátira).

Os gibões movem-se pelas árvores através da braquiação (balançando de um galho a outro, utilizando as mãos para agarrá-los), apresentando versatilidade e destreza. Os homens movem-se com o apoio das duas pernas, sem que apresentem muita versatilidade e destreza; caso tenham idade avançada, utilizam uma haste de madeira ou metal chamada bengala; caso sejam machos dominantes, locomovem-se sobre rodas motorizadas, aves de metal, entre outros.

Somente os seres humanos, entre as formas atuais, apresentam uma postura ereta e bípede de locomoção a passos torpes, envolvendo uma estrutura especializada da pélvis (muito requisitada para as conquistas sexuais) e dos membros inferiores, deixando assim os membros superiores livres das funções obrigatórias de suporte, equilíbrio e locomoção para poderem realizar outras funções vitais, tais como realizar atos obscenos com os dedos, chamar o garçom ou, no caso dos machos, segurar o pênis no momento da micção.

Por vezes, em filosofia, mantém-se certa distinção entre as noções de pessoa e de ser humano (ou homem). Esta refere-se à espécie biológica enquanto aquela refere-se a um agente hipócrita. Segundo a perspectiva de john locke, a noção de pessoa engloba uma coleção de operações e ações mentais. O termo pessoa poderá, assim, ser utilizado para ser feita referência a seres mitológicos, inteligência artificial, seres extraterrestre e insanidades do gênero ou, não menos importante, aludir a algum poeta brilhante.

Uma importante questão da teologia e da filosofia da religião diz respeito à dúvida sobre deus ser ou não ser uma pessoa. Uma importante questão da lógica diz respeito à dúvida sobre os teólogos e os filósofos da religião serem realmente pessoas.

Surgimento e evolução da espécie

Ao longo da história humana, desenvolveram-se diferentes concepções acerca do surgimento do homem — sejam elas míticas, religiosas, filosóficas ou científicas —, cada uma com sua própria explicação, elaborada ou sem nexo.

Povos mesopotâmicos acreditavam que o homem surgiu da terra, feito uma planta — o que, ainda hoje, é corrente em bares e botecos, onde os homens tentam (re)nascer regando a si mesmos. O povo acádio afirmava que o primeiro homem era filho de um deus; todavia perdera a imortalidade. Ainda hoje, alguns povos creem que o homem, moldado a partir da lama, surgiu à imagem e semelhança de um deus, criando as mulheres a partir de uma costela do homem e expulsando os dois depois de comerem uma maçã. (este mesmo povo também acredita que os coelhos botam ovos.)

Para o grego hesíodo, a mulher tornou-se responsável por todos os males da humanidade depois de abrir a caixa de pandora — pensamento que atualmente foi desmistificado ao ser constatado que os males da humanidade existem porque schopenhauer os trouxe à tona.

Em se tratando de teorias lógicas — mas não menos sádicas —, a origem do Homo sapiens encontra-se, hoje, explicada pela teoria da evolução das espécies, proposta por charles darwin, amplamente escorada por fatos científicos e odiada pelas mesmas pessoas que acreditam nos coelhos e seus ovos. Se num contexto religioso a origem do homem se explica com certa intervenção divina, num contexto sensato o ser humano originou-se com certo desdém da natureza em seus meandros evolutivos.

Na busca pela origem do homem, a arqueologia, a antropologia e a idiossincrasia tiveram papel preponderante. A cada ciência seguiu-se o papel de desvendar certas questões menores a formarem hipóteses para a questão magna, a saber, de onde, raios, viemos? Dos fósseis encontrados, foi possível determinar uma filogênese desagradável o bastante para fazer o papa papar moscas. A cada registro fóssil encontrado, maiores detalhes foram se agregando para desembocar no que hoje temos como a teoria — ainda que incompleta — acerca de nosso surgimento.

Fig.2: Em escavação, arqueólogo encontra o fóssil de um ancestral humano.
Fig.2: Em escavação, arqueólogo encontra o fóssil de um ancestral humano.

Dentro deste rol de evidências, descobriu-se que humanos e chimpanzés começaram a divergir somente há cinco milhões de anos. Embora muitos cientistas já tenham notado a proximidade entre os homens e os grandes macacos, recentemente esta afinidade foi melhor estudada. Verificou-se que 98,9% da sequência de pares de bases do ácido desoxirribonucleico são similares entre o homem e seus parentes mais próximos. A fração divergente engloba genes responsáveis pelas conquistas sexuais pervertidas, calotes no imposto de renda e adaptação fisiológica para digerir uma feijoada.

Todavia, nenhuma pessoa é capaz de confundir um homem com um macaco, exceto se for míope ou se tiver o intuito de ofender nossos ancestrais. Sob a égide das comparações morfológicas entre chimpanzés e humanos, várias diferenças podem ser apontadas com facilidade, sejam elas a postura, a descompostura, a locomoção, as obscenidades verbais, os devaneios sexuais, entre outras. A existência de dois gêneros separados para esses organismos decorre das diferenças apontadas acima, e, é claro, pelo fato de os classificadores serem seres humanos arrogantes e amantes de idealismos sexuais.

<em>Fig.3</em>: Quadro filogenético humano. Os ancestrais já descobertos são insuficientes para excluir todas as lacunas ainda existentes. Entretanto, pode-se notar que o grau de evolução não se alterou suficientemente para evitar erros de comparação intelectual entre o <em>Homo demens</em> e o <em>Ardilopithecus pravus</em> (em latim, <em>depravado</em>).
Fig.3: Quadro filogenético humano. Os ancestrais já descobertos são insuficientes para excluir todas as lacunas ainda existentes. Entretanto, pode-se notar que o grau de evolução não se alterou suficientemente para evitar erros de comparação intelectual entre o Homo demens e o Ardilopithecus pravus (em latim, depravado).

Independentemente dos pensamentos possíveis, percebe-se que cada vez mais o ser humano é considerado pela ciência como apenas mais uma espécie, o que possibilita a insurgência de oposições e críticas preconceituosas de alguns pesquisadores beatos e da massa social disforme e acéfala.

O botânico suíço carl von linné, criador da taxonomia moderna, recebeu severas e inúmeras críticas por colocar o homem no mesmo reino que os cães, os ornitorrincos e as hienas. (ao menos descobriu-se, depois, por que as hienas riem.) Thomas Huxley, naturalista inglês, reconheceu uma ampla afinidade entre símios e seres humanos; utilizou suas descobertas, depois, para ridicularizar um vigário vigarista e defender Charles Darwin. Este, o maior de todos os evolucionistas, especulou o suficiente para fazer qualquer homem rir de sua posição na natureza.

Fica clara, por fim, a tendência científica de retirar do homem a ilusão de sua magnificência, entendendo-o como apenas mais uma espécie com algumas poucas características mais complexas que os demais organismos (seja ela a capacidade de diferenciar e nominar um abacaxi e um limão) e outras menos desenvolvidas em relação a outras espécies (tais como tirar cera do ouvido).

Habitat e migração

De acordo com as teorias mais comumente aceitas e menos comumente torpes entre os antropólogos atuais, o Homo sapiens teve origem nas savanas africanas entre cento e trinta e duzentos mil anos atrás. Descendente do Homo perfidiosus, condenou, ou melhor, colonizou a eurásia, a eutanásia e a oceania quarenta mil anos atrás, vindo a colonizar as américas há apenas dez mil anos.

<em>Fig.4</em>: Quadro da migração humana baseado em estudos de arqueólogos e paleo-antropólogos. A áfrica é vista como o berço do <em>homo sapiens</em> que, posteriormente, irradiou-se para a europa, ásia, oceania, américas e, posteriormente, lua.
Fig.4: Quadro da migração humana baseado em estudos de arqueólogos e paleo-antropólogos. A áfrica é vista como o berço do homo sapiens que, posteriormente, irradiou-se para a europa, ásia, oceania, américas e, posteriormente, lua.

Levando-se em conta que existe vida no planeta terra há mais de três bilhões e meio de anos, pode dizer-se que o ser humano é uma espécie recente, embora seja uma espécie demente. Para efeito didático, pode-se tecer o seguinte paralelo: se existisse vida há 10 dias, o Homo sapiens teria surgido no último minuto na áfrica, há apenas um segundo na eurásia e oceania, há um quarto de segundo nas américas e há um milésimo de segundo nos prostíbulos das grandes cidades.

O Homo sapiens ocupou o lugar do Homo impudens, do Homo vulgaris e de outras espécies do Homo inabilis devido à sua capacidade superior de reproduzir-se, maior competitividade acerca dos recursos naturais, melhor adaptação aos conflitos sexuais e maior destreza frente ao canibalismo financeiro.

Anatomia e fisiologia

Os seres humanos adotam uma postura ereta, além de possuírem um cérebro bem desenvolvido (a ponto de ter criado o abridor de latas e o peso de papel), o que lhes proporciona capacidades diversas, tais como o raciocínio abstrato (que favorece a imaginação de fantasias sexuais), a linguagem (a permitir a criação da poesia e a troca de insultos) e a introspecção (que permite ao homem uma desculpa para tornar-se filósofo).

O homem apresenta locomoção bípede completa, com exceção dos coxos, dos mancos e dos que sofrem de unha encravada. Este fato proporciona a utilização dos membros anteriores para a manipulação de objetos (e. g., controles remotos e bolas de boliche) por meio da oponibilidade dos polegares. Os humanos variam substancialmente em relação ao peso e estatura, conforme a localização, a idade e os aspectos histórico-sociais. Apesar de o peso ser amplamente determinado pelos genes, é, também, influenciado em demasia pelos hábitos alimentares, exercício físicos e estado civil.

Comparando-se com a pele de outros primatas, a pele humana possui menor pelagem. A cor dos pêlos e da pele é determinada pela presença de pigmentos. Nos humanos atuais, tal coloração pode variar desde o rosa pálido até o castanho escuro — o que permite uma série de considerações arrogantes sobre supremacia de raça e outros conceitos petulantes. Devido aos humanos serem bípedes, a coluna vertebral e a região pélvica tendem a sofrer desgaste, criando, pois, dificuldades locomotoras em indivíduos mais idosos e em quem imita o elvis presley.

A necessidade individual de uma administração regular de comida e bebida é proeminentemente refletida na cultura humana. A falha na obtenção de comida leva ao estado de fome e, eventualmente, ao de inanição. (sofrem com isso os assaltantes de geladeira e afins.) Por sua vez, a falha na obtenção de bebida leva à desidratação e ao estado de sede, proeminente em desafortunados perdidos no meio de um deserto e alcoólatras. Tanto a inanição como a desidratação podem levar à morte se não forem combatidas: o ser humano pode sobreviver cerca de dois meses sem comida, mas somente cerca de três dias sem bebida (ou duas horas, para o caso dos bêbados).

O corpo humano está sujeito a várias patologias e ao processo de envelhecimento, o que lhe confere fragilidade e cuidados especiais, tais como medicamentos para o combate de doenças e produtos cosméticos para encobrir o óbvio. Em algumas sociedades mais modernas já é possível o combate à senilidade por meio de intervenções cirúrgicas (em se tratando do aspecto físico) ou o uso de pílulas azuis (em se tratando do aspecto sexual).

Para um Homo sapiens conhecido como gilles deleuze, um corpo pode ser controlável, pois a ele podem ser atribuídos sentidos lógicos. Somos, para deleuze, máquinas desejantes — o que resume, em teoria, qualquer visita a um shopping center. Para merleau-ponty, outro famoso hominídeo, o corpo é o espelho de outro corpo. Todavia, este não é o tipo de pensamento que agrade àqueles que se deparam com uma múmia.

Algumas curiosidades

Um ser humano perde cerca de quarenta a cem fios de cabelo por dia. O stress aumenta este número.

O cóccix, na base da espinha, é tudo o que nos resta das caudas dos nossos antepassados. Há quem acredite que a selvageria também permaneceu.

Os músculos do coração criam pressão suficiente para esguichar sangue a mais de nove metros — o que é um ótimo detalhe para os diretores de filmes de terror.

Em média, um maço de cigarros tira duas horas e vinte minutos de vida de uma pessoa. Em média, quem fuma dá de ombros para este tipo de estatística.

Quando chegamos aos setenta anos, já respiramos ao menos seiscentos milhões de vezes. Para quem fuma, o número é bem menor — mas é outra estatística para ficarem indiferentes.

O coração de um embrião começa a bater durante a terceira semana de gestação — se a mãe não tiver tomado a pílula do dia seguinte.

A dor de dentes é a dor mais forte de todo o corpo humano; as mulheres dizem que é a dor do parto; os recém-nascidos diriam que é a dor de nascer.

Rir durante o dia faz com que durmamos melhor à noite. Rir durante a noite faz com que notemos a insônia.

O músculo mais potente do corpo humano é a língua, o que garante um pretexto para o sexo oral.

Tal como as impressões digitais, a superfície da língua é diferente de pessoa para pessoa. Eis outro pretexto para o sexo oral.

O coração de um recém-nascido bate entre cento e trinta e cento e quarenta vezes por minuto; o de um adulto, entre sessenta e oitenta vezes; o de um morto, nenhuma vez (a não ser que se use o desfibrilador).

O homem como ser pensante

fig.6: <em>O homem vitruviano</em>. Ilustração feita a partir do documento original de Leonardo da Vinci (do gênero <em>Homo</em> e verdadeiramente <em>sapiens</em>)
fig.6: O homem vitruviano. Ilustração feita a partir do documento original de Leonardo da Vinci (do gênero Homo e verdadeiramente sapiens)

(eis uma seção conturbada e discutível frente aos muitos exemplos proporcionados pelo Homo sapiens enquanto ser vivo. Em teoria, a racionalidade do ser humano torna-se o cume da portentosa montanha da evolução; mas a prática é distinta quando apresenta-nos um caráter parco, risível e pautado sobremaneira na tartufice. Dentro de preconceitos e crenças absurdas, o homem desmascara-se quando se esquece de agir segundo o cinismo necessário para encobrir tais traços. Esta dissimulação é o que faz as pedras serem pedras e os homens, rudimentares.)

A mente humana tem várias características distintas. É responsável pela complexidade do comportamento humano, especialmente a linguagem e o enlevo do ridículo. A curiosidade e a ciência levaram ao aparecimento de um sem-número de explicações para a consciência e a relação entre a mente e o corpo. A psicologia, em seu ofício, estuda tais manifestações e relações sob o ponto de vista científico. As perspectivas religiosas, em contrapartida, enfatizam geralmente a existência de uma alma a ser a essência do ser, associada à crença em deus, deuses, espíritos, gnomos, espaguetes, entre outros.

Em outro extremo, a filosofia tenta, sem muito êxito, sondar as profundezas de cada uma destas perspectivas. Disso decorre um grande aparato técnico para desvendar toda a complexidade e alcance do homem enquanto ser pensante. Há rumores de que heidegger, um filósofo — mas há quem acredite ser um ente metafísico —, respondeu muitas das questões sobre o ser e a consciência. No entanto, o filósofo não conseguiu responder a crucial pergunta, a saber, sua própria filosofia seria entendida?

A consciência, uma qualidade da mente ou uma condenação ao desespero, abrange atribuições tais como subjetividade, autoconsciência, sapiência, e a capacidade de perceber a relação entre si e o ambiente. Aos bêbados, isso não tem muita importância.

Por sua vez, a razão é a faculdade de raciocinar, compreender, julgar. Tendo em mente as ciências jurídicas, temos uma contradição: um julgamento se faz por homens que pensam serem racionais dentro de um mundo próprio racionalmente inerte e duvidoso.

Empregada no campo filosófico, a razão comporta uma série de significados, a saber:

a. A razão como característica da condição humana;
b. A razão como princípio pelo qual as coisas são o que são, sem desculpas;
c. A razão como diálogo, com conteúdo permanente, o conhecimento de si mesma e da essência de todas as coisas, do universal;
d. A razão como método que permite, pela discussão, chegar à síntese depois de atropelar a tese e rir da antítese.
e. A razão como conversa para ruminante adormecer.

Há quem pense ser a razão subordinada à fé, haja vista que o critério supremo da verdade é a revelação divina. Nesses termos, a razão é tida como instrumento não de demonstração, mas de afirmação da fé — e a fé como instrumento de ridicularizar a razão.

Durante séculos, os filósofos buscaram uma definição exata do que é o homem, sendo, talvez, a mais conhecida aquela que o descreve como um bípede implume. Aristóteles a concebeu quando afirmou que o homem é um animal racional (mas este não foi seu único erro). É na filosofia de hegel que se encontra a primeira tentativa de introduzir a razão na história. Mas é na história que se vê a primeira tentativa do homem de ignorar a razão.

A história do homem

O Homo sapiens é uma espécie eminentemente sociável (em teoria), capaz de criar sociedades sobre estruturas complexas (em teoria), compostas de muitos grupos cooperantes e competidores (mais competidores que cooperantes).

Na tentativa de compreender e manipular o mundo ao redor, o ser humano desenvolveu um conhecimento tecnológico ímpar, capaz de exterminar uma cidade inteira a partir da reunião de uma equipe de físicos, matemáticos e uma porção de urânio. Estas instituições levaram ao surgimento de artefatos em comum, crenças, rituais, valores, mitos e leis que, em conjunto, formam uma cultura de massificação e estultice.

Entrementes, a história é o estudo da ação humana ao longo do tempo, a partir de concomitante estudo dos processos e dos eventos ocorridos no passado. A intenção disso, dizem os estudiosos, é a de poder melhorar o amanhã a partir das experiências pretéritas. Depois de duas guerras mundiais, bolsões de fome e miséria e o ainda vigente e conhecido egoísmo geopolítico das nações, resta saber quando será que tais melhoramentos serão postos em prática.

O estudo histórico se inicia quando os homens encontram elementos de sua existência nas concretizações dos seus antepassados — por inveja ou qualquer que seja o motivo. Do ponto de vista europeu, a história divide-se em dois grandes períodos: a pré-história e a história. Para esta última, nos resta uma breve análise.

As civilizações do passado

A antiguidade compreende os fatos históricos entre quatro mil a.R. (antes do Ridículo) e 476 d.R. (depois do Ridículo), quando ocorreu, então, a derrocada do império romano do ocidente. É estudada com estreita relação ao oriente (sobretudo no chamado crescente fértil), onde floresceram as primeiras civilizações, atraídas pelas condições agrícolas e pela liberdade frente à inexistência, na época, da especulação imobiliária. Neste espaço geográfico, surgiram as culturas egípcia, palestina, mesopotâmica, iraniana e fenícia.

O período antigo abrange, ainda, as chamadas civilizações clássicas, a saber, grécia e roma, caracterizadas pelo escravismo, pelas guerras e pelo avanço científico e cultural. Pode-se dizer que a atualidade consumou-se tendo como fundamento todo o conhecimento adquirido por essas civilizações precoces. O homem atual torna-se, por isso, um meliante.

A transição para o presente

A chamada idade média abrange o período que se estende de 476 d.R. Até 1453, quando ocorre, então, a conquista de Constantinopla pelos turcos-otomanos. É estudada em relação às três culturas então em confronto na bacia do mar mediterrâneo. Caracterizou-se pelo modo de produção feudal, pelo regime de servidão e, claro, pelas guerras.

A idade moderna, de 1453 até 1789 (data da Revolução Francesa), compreende o período da invenção da imprensa, dos descobrimentos marítimos, pelo renascimento cultural e urbano, pela opressão social e, claro, pelos conflitos armados. Sua característica mais importante aos dias atuais diz respeito ao nascimento do modo de produção capitalista, no qual os homens acumulam capital para comprar iates, macarrão instantâneo e serviços sexuais.

O homem contemporâneo

A chamada idade contemporânea compreende a época entre 1789 até aos dias atuais. Envolve-se de conceitos tão diversos quanto o grande avanço da técnica, dos conflitos armados de grandes proporções e da chamada nova ordem mundial. Tem como características a exploração humana, o abuso de poder, os conflitos irrisórios e, sem dúvida, pelas ocasiões bélicas e seus pretextos vazios.

Destarte certa tristeza evolutiva, é de se lamentar que ainda hoje seja possível encontrar caminhando entre os homens espécimes de Homo sapiens (sic, sic, sic) que, se vistos à luz da evolução, têm de ser considerados o ápice da cadeia evolutiva. Assim, somos nós obrigados a acreditar — e a lamentar — que muitos daqueles que nos cercam são o resultado da seleção natural e, mais do que isso, da disputa incessante pela sobrevivência (não só a partir das qualidades biológicas, mas — o que torna o fato triste — das qualidades intelectuais).

Talvez estes traços de erro da história da humanidade tenham sobrevivido à sombra dos H. sapiens verdadeiros, feito hienas perdidas; o que nos leva a concluir que deve-se ter como natural o fato de podermos nos deparar com tais seres abstrusos ao abrir a porta de casa.

O amanhã do homem

Intervalo de tempo que se inicia após o presente, o futuro não tem um fim definido. Tampouco o presente. O futuro é utilizado na mecânica clássica para tratar daquilo que está por vir, além de ser utilizado pelos pessimistas para falar daquilo que, com o devido tempo, ocorrerá. Na mecânica quântica, a ideia de futuro já não mais existe, pois este atua de forma atemporal. E da mesma forma para os loucos.

Por se tratar daquilo que ainda não ocorreu, o amanhã do homem é comumente tratado sob os auspícios das hipóteses. Todavia, a espécie humana é magna em ressentimentos e devaneios, dando a si a possibilidade de tratar do futuro como banalidade e esperança. Aos poetas e escritores fica a petulância de cantá-lo; aos amantes da metafísica e das arte divinatória, fica o humor e o rumor das previsões ridículas.

O Homo sapiens, em seu momento atual, comporta mais de seis bilhões de espécimes. Os intelectuais creem ser a extinção uma realidade muito distante; já os intelectuais sérios acreditam que a espécie humana tem seu aniquilamento programado para mais algumas décadas. O porvir, como se nota, é realmente humano: equívoco, cômico e possivelmente impossível.

Referências bibliográficas

ABWEICHUNG, Otto von. Extinct Humans.

BELACHELIJK, Ericsenn. The evolution of human populations.

BELASTER, Esther. Human races: A genetic and evolutionary perspective.

DÉMORALISÉ, Jean-Paul. The Human Inheritance: Genes, Language, and Evolution.

ENNUYÉ, Dominique. The Fossil Trail: How We Know What We Think We Know about Human Evolution.

ERMÜDET, Arthur. Genetics and the making of Homo sapiens.

GEMIST, Franz. Genetics of modern human origins and diversity.

LASSÉ, Anne. The human genome and our view of ourselves.

NUTTELOOS, James. In the Footsteps of Eve: The Mystery of Human Origins.

ONDERDRUKT, Jeanne Marie. Genetic evidence for complex speciation of humans and chimpanzees.

ONTMOEDIGD, Friedrich. The “Eve” hypothesis: a genetic critique and reanalysis.

OVERHEERSEND, Ewan. Genetic traces of ancient demography.

PERFIDE, Susan. Molecular genetics of speciation and human origins.

QUALVOLL, George. The History and Geography of Human Genes.

TÜCKISCH, Carl. The demographic history of modern humans.

VERNUNFTWIDRIG, Émile. Modelling the recent common ancestry of all living humans.

VERMOEID, Joseph. The Wisdom of the Bones: In Search of Human Origins.

VERPASST, Sofia. Human Evolution.

VERRADERLIJK, Richard. African Exodus: The Origins of Modern Humanity.

VORHERRSCHEND, Peter. Origins Reconsidered.

WEARIED, John. Population bottlenecks and Pleistocene human evolution.